quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Black Music o "Q" da questão (PARTE 1)

Não pretendo me aprofundar muito, porém, é importante dar uma passadinha rápida pela história da Black Music para que possam ser entendidos os elementos a serem considerados e abordados um pouco mais adiante nesse texto.
Por definição estaremos entendendo como Black Music todo e qualquer gênero musical, negro, de procedência afro-americana, foco da nossa conversa.
O início da história se dá no período compreendido entre os séculos XVII e XIX, com a chegada dos escravos da África para os Estados Unidos, principalmente.
Durante esse período o canto comum que os negros entoavam era o Spiritual, algo que poderíamos ter hoje como música religiosa ou algo do tipo, considerada naquela época como o canto da libertação.
A partir daí muitas variações começaram a ocorrer e, de forma bem resumida podemos elencar:
Século 20, dominado pelo Gospel, Jazz e Blues.
Nas décadas de 50 e 60, época dos movimentos anti-raciais, imperava o crescimento da soul music, dentro de um cenário de movimentos de liberalismo que fez com que a Black Music ganhasse maior espaço e força nas rádios e noites americanas, destacando músicas que reclamavam a ótica da condição negra com um forte apoio da Motown que, em pouco tempo, se tornaria o grande nome dentre as gravadoras no cenário musical americano.
Na década de 70 o Funk Soul foi quem dominou as pistas de danças internacionais, inclusive as brasileiras, abrindo espaço para uma maior apreciação da música do povo negro em si.
A década de 80, marcada pelo reinado dos Jackson Five, determinando o ponto alto do movimento, impetrando coreografias contagiantes e passos marcados cheios de inovações e criatividades, abrindo uma imensa lacuna para o surgimento de tantos outros grupos e ao Black Rhytm Funk Soul Music.
Com o aporte de gravadoras em um cenário de crescente evolução e aceitação, começou a nascer um processo de segregação no estilo musical Black, surgindo então um cardápio musical composto de Blues, Jazz, Gospel, Soul, Black Spirit, Funk, Charme, Rap, Ronck and Roll, Rhytm and Blues e Hip Hop à disposição de apreciadores no mundo todo.
Pois bem, aqui começa de fato a nossa conversa.
No nosso imenso país tomado por uma grande população afrodescendente, a Black Music também ganhou suas variações recheada de histórias e de nomes merecedores de muito respeito, dentre os tantos posso destacar com clareza - e já com o antecipado pedido de desculpas para os que se sentirem ofendidos pela omissão de algum outro nome também tão importante e grandioso, lembrando que nem estudioso do assunto sou, apenas mais um adepto - Tim Maia, Gerson King Combo, Jorge Ben Jor, Sandra de Sá, Tony Tornado, Jair Rodrigues, Wilson Simonal, Ed Mota, Paulo Diniz, Lady Zu, Gilberto Gil, Cláudio Zoli, Sampa Crew, Thaíde & DJ Hum, Bennê dentre tantos outros.
Na época áurea da nova geração da Black Music, mais precisamente nas décadas de 80, era notória a diferença de poder aquisitivo entre a raça negra e a raça branca em todos os pontos onde existisse uma comunidade negra que, além de enfrentar obstáculos para encontrar mídia em seu favor, que possibilitasse divulgar sua descoberta sonora e, quando o conseguiam, ainda tinha o agravante de que seus consumidores diretos, na mesma condição de pobreza, pouco conseguiam adquirir os produtos gerados nas lojas que os comercializavam.
Felizmente o material era de grande qualidade e aceitação pública, graças ao sucesso que os negros norte-americanos faziam por todo o canto do mundo.
Agora pensa.
Se não se conseguia consumir o produto nacional, quem diria o internacional, com todas as limitações tecnológicas que existiam se comparadas com os dias atuais.
Pois bem, para a alegria do nosso povo, nessa época existiam as famosas fitas K7 e programas como os da Band FM, 96.1Mhz, que aventurava a investir na Black Music com uma programação alternativa, empenhando-se em apresentar os lançamentos e novidades da época, organizada com a participação de DJs das grandes equipes e casas noturnas como Chic Show, Black Mad, Zimbabwe e outras mais em programas como o Charm Dance, o Som da Massa e o Black in Love.
Às quintas-feiras e sábados à noite, ali pela faixa das 22H00 era tiro certo ouvir a Band com a fitinha preparada no gravador.
Nessa época de dificuldades extremas, começaram a crescer alguns movimentos específicos do interior.
Aqui em Piracicaba recebíamos as equipes de ponta para shows que atraíam adeptos de toda a região.
As equipes vinham de São Paulo, com caixas e caixas de vinil - enfim, como profissionais do ramo eles investiam e, por estarem num grande centro, sempre traziam as "bolachas" do que tinha de melhor rolando no cenário musical.
A dificuldade em adquirir as músicas fazia com que os LPS que eles traziam nos parecessem ser raridade.
Por muitas vezes tínhamos que encomendar, reservar e até pagar um pouco mais (não bastasse o valor extra que já havia embutido no preço para disponibilizar o material aqui no interior) por um vinil, só para ter AQUELE material com AQUELA música.
Era comum nos grandes shows os DJs arremessarem a capa de um LP para o público, que se engalfinhava para pegá-lo e conseguir "na faixa" um material "exclusivo" - ao menos por um tempo ele ficaria nessa condição - pois de fato o normal seria demorar um tempinho para que o mesmo chegasse a Piracicaba e, muitas vezes, poderia chegar num preço que inviabilizasse não tornasse a aquisição do mesmo viável. Mas existia a santa fitinha K7 que
permitia a cópia do LP como um todo e, como plano B, com um pouquinho de sorte, a Band FM, tocando – ainda enquanto estivéssemos acordados, pois muitas vezes deixávamos a fitinha gravando o programa inteiro e gerava um pouquinho mais de trabalho para encontrar "aquela" música que interessasse - para a gente gravar.
Com isso, uma disputa pessoal diferente passou a se criar.
Me lembro muito das “rodinhas da galera” onde declarava-se com orgulho ter "tal música" ou ter comprado "tal LP".
Muitos nem emprestavam o seu precioso bem, pois LP, além de riscar, tinha o poder extra-sensorial de sumir e criar uma grande confusão.
Nasciam nessa época os famosos DJs Piracicabanos, dos quais muitos ainda estão em ação sempre que surge uma oportunidade.
Costumo denominar os DJs daquela época como os DJs de Vanguarda.
Muitos desses não conseguiram acompanhar a evolução da tecnologia e nem mesmo da indústria fonográfica e acabaram estacionando pelo caminho e perdendo o interesse pela caminhada, pois ficou muito complicado migrar das Technics para os notebooks, sistemas operacionais, técnicas inovadores e demais recursos que o avanço tecnológico trouxe como desafio aos profissionais e adeptos dessa área.
Creio que o ponto crucial nessa transição, e agora falo dos DJs Contemporâneos, ficou exatamente no preciosismo e valorização do acervo.
Hoje as redes sociais, sites de entretenimento e páginas direcionadas aos mais diversos estilos e gêneros, permitem a aquisição de todo e qualquer material de ponta em poucos clicks, por um valor totalmente acessível quando há a incidência de custos.
A música mal sai do estúdio e rapidamente está disponível no espaço cibernético para consumo público.
Mas ainda assim existem alguns DJs que insistem em supervalorizar o produto e elevá-lo ao nivel de gema... ao nível de diamante de quilate raro.
Sei lá... não entendo e nem vou entender o que isso vem agregar para o universo musical e, talvez, nesse momento, nem mesmo a esse texto.
O que acontece é que a Black Music continua produzindo muito e quebrando tabus e recordes, vide Pharrell Williams com sua música Happy quebando recentemente os recordes de download na rede mundial.
Hoje as versões exclusivas podem ser criadas livremente, desde que se possua conhecimento técnico e musical suficientes para fazê-lo.
Acabou a briga... quem pode mais chora menos e quem entende mais, cria algo melhor todos os dias.
Os grandes centros possuem os famosos TOP DJS e aos poucos o universo da Black Music vem destacando os seus também.
Tenho observado muito as casas, rádios e tvs de nome divulgando os "Top Djs" em sua maioria com todo um estilo nada condizente com o mundo da Black Music, mas vendendo-se como Dj do gênero. Nem por questão de raça ou cor, mas sim pela influência musical, enfim, até mesmo a "black music" que eles tocam provém de uma linha com forte apelo comercial e com pouco a ver (talvez nem haja algo a ver) com o Black Music que os adeptos de fato curtem, o verdadeiro Black Style que toca a comunidade negra, seja pela sonoridade ou até mesmo pelas letras.
Há todo um sincretismo nesse meio que me leva a respeitar a classificação da música elencada como Black, mas que não me convence a consumi-la.
Aqui no interior paulista, mais próximo de mim, existem pontos de "Real Black Music" sendo executados com louvor em cidades como Capivari, Tietê, Piracicaba, Limeira, Rio Claro, Araraquara dentre outras.
O movimento como um todo é muito interessante, podendo-se identificar e diferenciar os veteranos, os novatos, os inovadores, os saudosistas e tantos outros mais, porém, em movimentos separados para curtir um mesmo gênero musical.
Observa-se nesses eventos a diferença comportamental, o diferente tipo de energia que domina os bailes blacks conforme a aglomeração em sua divisão de faixa etária, região geográfica e até mesmo preferência por estilo dentro do mesmo gênero musical.
Trocando em miúdos pois essa passagem é importante e não pode deixar dúvidas.
Noto que: Há eventos direcionados para o público mais jovem, assim como existem eventos programados para público um pouco mais velho.
Por si só, já está delimitado qual será o público a “dominar” os espaços em cada evento de Black Music que já estão previamente programados para Piracicaba.
Frequentando esses eventos, fica muito claro essa separação e, se frequentar todos, ficará muito claro também o comportamento do público no evento.
A energia é diferente.
A experiência de cada um dos frequentadores também se diferencia e, se por um lado define-se tribo, por outro perde-se o avanço cultural, uma vez que no mesmo evento apesentam-se músicas do passado e do presente.
Entendo isso como sendo algo natural do interior, uma vez que, frequentando eventos na capital e até mesmo cidades maiores, pode-se observar a “salada mista”, com público das mais diversas idades dividindo o espaço e o entretenimento, o que entendo valorizar e fortalecer muito o movimento em si.
Abordarei melhor essa passagem em momento oportuno da segunda parte desse material.
No próximo post tentarei trazer a visão mais polêmica de alguns fatos e acontecimentos para que possamos refletir um pouco mais sobre o movimento.
Vamos conversar um pouco sobre a postura do DJ Piracicabano e, se me ajudarem, pois o espaço é para criar discussão e troca de opiniões, entender se há ascensão através da resposta para duas perguntinhas SIM (ou não) e por que?
Vamos trazer elementos para discutir um pouco as diferenças (ou semelhanças) comportamentais na subdivisão dos grupos por gostos e interesses dentro do cenário da Black Music local.
Gostaria de mencionar algo sobre o protecionismo, às vezes radical, sobre o universo da Black Music e a possibilidade de integração com outros estilos em um mesmo evento.
Quero deixar também uma pitada do sentimento que tenho referente à Black Music, que não toca na TV, muito pouco nas rádios ou seja: é som de gueto?

Quero mais é interagir e sempre trazer elementos que gerem discussões saudáveis.

Para muito em breve, temos os seguintes eventos de Black Music elencados e, como são poucos e raros em nossa cidade, vale deixar as dicas aqui:

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Quem fala que só curte jungle e que não gosta de mais nada é hipócrita. Se eu entrar na casa dele, vou achar discos dos Bee Gees e Diana Ross. A mesma coisa vale pra quem disse que só ouve house, se eu for pra dele vou achar discos de rock e funk. E o mesmo vale pro cara que fala que só ouve hip-hop, vou achar estilos diferentes na casa dele também. As pessoas gostam de todos os estilos musicais. Elas se amarram num estilo e agem como se fosse delas. Música é música”.

Afrika Bambaataa

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