Enquanto muitos ainda sonhavam
com acesso à internet e invejavam os poucos privilegiados que tinham acesso à
essa tecnologia, nós, que por algum motivo conseguíamos acessá-la, tínhamos
algumas manias um tanto estranhas.
Isso ocorria lá pelos meandros
dos anos 90 e, para ser um pouco mais específico, algo entre 1995 e 2000. Era
muito interessante observar o comportamento da época.
Os usuários em sua grande maioria
acessavam a rede para buscar músicas, era uma porta sem trancas aberta para o
mundo, que dava para nós a possibilidade de buscar e compartilhar os mais
variados títulos e estilos.
Não existia ainda qualquer menção
à banda larga e as mais velozes conexões não chegavam aos pés da velocidade
oferecida pelo já ultrapassado 3G que muitos ainda (inclusive eu) utilizamos
nos telefones celulares, para se ter uma ideia, baixar um arquivo MP3 nas
melhores conexões – refiro-me às de onda de rádio, pois as opções eram a
discada, muito popular, ou onda de rádio, caríssima por sinal, que era a
coqueluche do momento – levava pelo menos 10 minutos, baixar um filme então –
nessa época VCD ou DIVX – era uma atividade para se perder algo entre 30
minutos ou 1 hora.
Mas não quero falar sobre essa
vertente, quero conversar mesmo sobre o bate-papos, ou chat, que era a grande
sensação aglutinadora da internet.
Das famosas salas de bate-papo,
hospedadas, gerenciadas e administradas por famosos provedores de sinais e
hospedeiros de sites, tangíveis a todos os mortais aos famigerados IRCS - mais
voltados à comunidade “nerds” ou aos usuários mais avançados e dividido por
comunidades com interesses, qualidades, localidades ou até mesmo loucuras em
comum – imperava um certo movimento muito interessante que com certeza rendeu
milhares de histórias no dia-a-dia dos viciados usuários ligados a essa louca
tecnologia cheia de possibilidades que tomava espaço na vida das pessoas.
As duas plataformas tinham muita
coisa em comum, principalmente a seletividade.
Existiam páginas e canais para
pessoas de várias faixas etárias, etnias, opção sexual, religião, revistas,
cultura, ciência, política, namoro e tudo mais que você possa imaginar. Para se
distrair – nem ouso dizer se divertir pois hoje tenho lá minhas dúvidas se de
fato era divertido – bastava ter a sorte de conseguir acessar à internet, ter
(ou arrumar) tempo ocioso, ter um pouco de criatividade para criar um apelido,
ou nickname – isso vai render um pouco mais de história em próximo texto, na
parte 2 dessa postagem – ter uma cara de pau além do normal, ousadia e
paciência.
Era normal você deparar com
apelidos que chamavam à atenção, sempre muito bem adequados ao espaço que
frequentavam.
Posso mencionar (ou criar) alguns
que ajudará a entender melhor como isso funcionava.
Em salas de namoro você encontraria
facilmente algum Amante Sentimental, alguma Loira Sensual, Carente 30,
Gostosinha 21, Safadão bem dotado, Morena Gostosa, Mulata-SP (ou qualquer outra
sigla de estado), Qualquer coisa Balzaquiana, sei lá o que ou quem Carente e
assim por diante.
Em salas de faixa etária ou de
variedades, você encontrava facilmente Docinha, Loira Gostosa, Mina da Balada,
Chapeuzinho Vermelho (e lógico o Lobo Mau), Gatinha (alguma coisa sendo
normalmente um número que presumia-se ser sua idade), Saradão das não sei
quantas, Negro Lindo, uma infinidade de doces que partia de nomes de chocolates
até a nomes com Maria Mole.
Uma loucura que fazia sentido.
As plataformas com o tempo
começaram a possibilitar inserção de códigos que permitiam o compartilhamento
de imagens, conseguindo com isso estreitar e aliviar um tanto a curiosidade
humana, já que naquele tempo, por ser algo direto – e até invasivo – as
conversas começavam assim:
“Qual o seu nome”
“Quantos anos você tem? ”
“Solteiro”
“Pode se descrever? ”
“De onde tc “ – até descobrir que
esse tc significava tecla, muita gente ficava olhando para a tela com a famosa
cara de U..Ó... e, dentre essas perguntas vinha a famosa “Tem foto? “ e olha
que não era normal termos câmeras digitais, pois essas nem existiam, mas,
pagávamos o preço para estar dentro da moda e fazíamos o scanner de alguma
fotografia nossa, só para ter o que compartilhar quando essa pergunta viesse.
Dependendo da resposta que você
desse para alguma dessas perguntas, poderia já ir se preparando para o adeus
não dado.
Rapidinho seu interlocutor
sumia... te deixava falando e, se bobear, a pessoa estava ali, tendo acessado de
forma tão rápida também com outro apelido e dando risada da sua cara de trouxa.
A exemplo do que rola hoje nos
sites de relacionamento, naqueles tempos também existiam duas modalidades de
bate-papo – tudo o que estou relatando eram comuns nas duas plataformas mais
populares que mencionei no começo desse texto: salas de bate-papo e IRCs –
havia o papo no “aberto”, onde todos os presentes na sala ou no IRC naquele
momento viam tudo o que estava rolando... um papo mais coletivo e existia o
papo reservado, onde duas pessoas conseguiam se comunicar de forma mais
reservada, com o papo limitado à visibilidade das duas partes interessadas.
Considerando a sala (ou canal)
que você estivesse frequentando, o papo – mesmo no aberto – muitas vezes era
pesado, jocoso, pois abusavam da ousadia e da cara de pau e soltavam mesmo o
verbo, fazendo com que muitos rissem e tantos outros ficassem encabulados.
Quantas vezes observei situações
incômodas que mexiam com o povo em geral a ponto de, após uma simples postagem,
a grande maioria dos presentes se retirarem daquela sessão de bate-papo.
Algumas pessoas – e nesse caso
independia do sexo – colocavam fotos de pornografias tão fortes para a época
que parecia um alerta de furacão chegando. Todos desapareciam, ficando apenas
os mais tolerantes, ou os que não estavam nem aí e outros que talvez nem mesmo
soubessem ao certo o que estavam fazendo lá.
No IRC havia uma vantagem, por
ser cuidada por moderadores, quando alguém andava fora da linha era banido do
canal e, como isso se fazia pelo IP do usuário – IP é o protocolo de internet,
número único atribuído à cada máquina – ele ficava impossibilitado de acessar
aquele espaço até que o “BAN” fosse retirado, ou seja, até que seu IP fosse
autorizado a frequentar o espaço novamente.
Fiquei muito triste quando fui
banido uma vez, pois além de gostar do canal, eu carregava um nickname muito
querido e respeitado, mas, por ter configurado o programa com uma entrada
automática, alguém acessou o programa, caiu automaticamente no canal utilizando
meu nickname e tocou um inferno que até hoje eu não sei qual foi, já que nunca
mais pude acessar aquele canal e depois perdi o interesse também, fazendo com
que eu ficasse com essa eterna curiosidade.
Essas plataformas, bisavós das
atuais redes sociais, hoje já são esquecidas pela grande maioria dos usuários
da época e, graças à evolução, pouco utilizadas hoje se comparadas a quantidade
de aventureiros atuais à quantidade de fiéis usuários do passado, porém, ainda
existem.
Para conhecer um pouco basta
fazer um passeio para portais como UOL, IG, TERRA e outros ou baixar um
programa IRCs – o qual já é um pouco mais complicado de se utilizar, porém, com
um pouquinho de curiosidade qualquer um ainda consegue se adaptar – e procurar
por canais tipo #Piracicaba, #Bahia, #25a35anos e assim por diante.
Ao contrário das páginas dos
portais, os IRCs nos permitiam contatar pessoas de várias partes do mundo,
bastando para isso mudar os servidores, conectando-se à servidores
internacionais e procurando as páginas ativas que nos levavam à canais como #Portugal,
#Espanha ou locais de vários países da Europa, Ásia, África e assim por diante.
Era uma louca viagem no tempo e espaço.
Ambas as plataformas traziam
contigo um hábito comum muito gostoso para a época.
Os usuários promoviam encontros
de salas ou canais, com direito a DJs, alojamento, comida, bebida e muita
festa, promovendo o encontro de apelidos virtuais na vida real, fazendo com que
viajássemos quilômetros, que nos deslocássemos para outras cidades e estados em
busca de estreitar aquela amizade criada e do prazer de poder conhecer
pessoalmente pessoas que para nós soava apenas como um apelido com um perfil
próprio, cheio de manias, sotaques (sim sotaque, pois dava para senti-los mesmo
nos bate-papos) e uma imaginária forma de ser, esse principalmente para aqueles
que não sabiam – ou não queriam, ou se preservavam ou não gostavam de – mandar
fotos pelos bate-papos ou e-mails.
Isso tudo era um sonho que se
materializava. Configurava um universo paralelo onde muitos em comum se
encontravam e tantos outros que desconheciam criticavam e, nesse caso, havia
muito mais crítico que adepto.
Plataformas que foram muito úteis
para se criar o formato de internet e, principalmente, páginas e sites de
relacionamentos que tanto acessamos e utilizamos hoje.
Salvo o fato de hoje utilizarmos
nomes ou apelidos mais ligados ao nosso dia-a-dia – mais próximos da nossa
realidade - e considerando o avanço da qualidade da plataforma, do sinal e do
conhecimento do ambiente virtual, no geral pouca coisa mudou, apenas se
popularizou mais e cresceu para outros lados o cardápio de opções... EVOLUIU.
Ahhh em tempo, a respeito dos apelidos, eu sempre me registrava como Poeta Casual, por motivos óbvios... os mesmo que me levam a escrever em meus blogs.
Aproveita, teça um comentário e compartilha conosco o apelido (ou nickname) que você costumava usar.
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